O estilo, a moda na publicidade, constitui uma temática que está relacionada com uma questão central inerente à teoria da comunicação publicitária: como gerir a dicotomia entre o artificialismo e a funcionalidade comunicacional relacionada com a objetivação de uma vantagem comercial competitiva, cuja publicação determina basicamente a mensagem publicitária ?
Por artificialismo, concebemos um estilo expressivo relacionado com a afirmação de um conjunto de valores que, na sua dimensão mais absoluta, atentam contra as especificidades formais da mensagem publicitária e que estão associadas à explicitação de uma referencialidade publicitária. Demonstramos como este fenômeno estava relacionado com uma Publicidade de Marca centrada na ação do emissor publicitário, isto é, com uma publicidade que se desenvolve a partir de valores que já não são mais estritamente de índole micro-econômica e unilateral.
Esta particularidade significa que a moda publicitária também pode remeter para outras realidades, apresentando uma potencialidade evocativa que já não remete exclusivamente para a divulgação de um produto.
A valorização cada vez mais intensa e freqüente de um imaginário não comercial está relacionada com a problemática da criatividade ao serviço da função. Deverá a criatividade submeter-se a uma função – neste caso uma função de índole comercial – ou sobrepor-se a ela, remetendo intertextualmente para outras funcionalidades, geralmente de índole comunicacional (de índole literária, teatral, cinematográfico, televisivo, etc.)? Esta questão é importante e está relacionada com problemáticas importantes ao nível do próprio design e dos processos de criação publicitária: deverá ao não existir uma confluência da criatividade artística na comunicação publicitária? No que respeita à moda na publicidade, ela deverá ser obrigatoriamente ‘publicitária’, comercial, ou poderá ser outra coisa qualquer?
Se considerarmos a mensagem publicitária como um texto adequado a um processo de comunicação singular, então deveremos considerar que tudo na publicidade se esgota num funcionalismo referencial de índole micro-econômica. Neste aspecto, a moda na publicidade só tem sentido a partir do momento em que ela apresenta um puro valor de comunicação publicitária, o mesmo acontecendo como a imagem e a palavra. Que acontece, todavia, nas situações em que a moda deixa de apresentar esse valor que reivindicamos? O que sucede quando os exercícios lingüísticos cada vez mais têm um valor que já não é comercial? Em tais casos consideramos que o processo de comunicação publicitária se encontra em transformação estrutural: ele ainda pode ser considerado como publicitário, mas já não é avaliado na sua dimensão mais pura.
Consideramos que este é o preço a pagar pelos fenômenos da intertextualidade pela qual a mensagem sobre o produto é cada vez mais um ‘pré-texto’, encontrando-se este remetido ao estatuto de adereço literário, teatral, cinematográfico, etc.. É posicionado – juntamente com a designação comercial - por referência a um mundo extra-econômico, a um cosmos de pessoas, ficando dependente já não de uma oportunidade econômica, mas de um conjunto de expectativas, de desejos, de temores, etc. que afetam decisivamente o seu estatuto. A divulgação comercial cada vez fica mais dependente dos caprichos da vida humana, do que constitui notícia, daquilo que está na moda. Trata-se de um fenômeno que conduz a uma transformação radical no estatuto do profissional de publicidade: de publicista passa a publicitário, a criativo, a estilista, a designer enfim a alguém que consegue objetivar as expectativas dos mais diversos públicos numa proposta comercial. Com as devidas distâncias no que respeita à especificidade dos fenômenos, consideramos a dinâmica que acabamos de mencionar muito semelhante à que se verificou a partir da Grande Depressão do século passado, em que a funcionalidade subjacente aos modelos da Ford - isto é, a tudo o que determinava a sua vantagem competitiva - deixou de se adequar às expectativas do público, que passaram a estar centradas, principalmente, no desenho e no conforto. Esta desadequação facilitou a emergência do styling quer dizer, daquela “modalidade de desenho industrial que procura fazer o produto superficialmente atrativo, freqüentemente em detrimento da sua qualidade e conveniência; (...) que fomenta a sua obsolescência artificial em vez da sua fruição e utilização prolongadas” (Maldonado, 1993: 41). O styling remete para uma resposta do regime capitalista à crise econômica da grande depressão, uma solução que se caracterizou por uma política de fabrico de muitos modelos de curta duração, uma política que se substituiu às anteriores orientações baseadas na concepção de poucos modelos de longa duração.
Para nós, esta dicotomia é importante para entender a especificidade de alguma a publicidade contemporânea que, curiosamente, também começou a surgir a partir da mesma altura (a estratégia de redução do preço do produto é substituída pela da promoção - Maldonado, 1993: 41): o estilismo publicitário atual é cada vez mais confundido com um decorativismo expressivo que nos faz lembrar o styling industrial da primeira metade do século passado. A estabilidade da mensagem publicitária, baseada na afirmação de uma vantagem competitiva, por intermédio de uma estratégia comunicacional de longa duração, é substituída, cada vez mais, por abordagens criativas dispersas, errantes diversas, por vezes incoerentes ou contraditórias, desenvolvidas ao sabor de oportunidades, cada vez mais limitadas no espaço e no tempo. Se bem que surpreendente e até escandalosa, a mensagem publicitária contemporânea é, nos dias de hoje, camaleônica e diletante.
Enfática, não consegue, todavia, resistir ao passar do tempo e está dependente de circunstâncias e de contextos de enunciação extra-econômica. Trata-se de uma situação que não deixa de constituir uma característica paradoxal, sobretudo quando pensamos nas campanhas publicitárias de grande alcance, integradas em estratégias de marketing global.